quinta-feira, 2 de abril de 2020

São João da Cruz: Doutor e Místico


São João da Cruz: Doutor e Místico

            São João da Cruz (1542-1591) foi o místico, que juntamente com Santa Teresa de Jesus (1515-1582), empenhou-se na Reforma da Ordem Carmelita no século XVI. São João da Cruz procurava no silêncio e na solidão a busca pela União com Deus e não conseguia ver isso nos Carmelitas de então. Enquanto pensava entrar numa Ordem Religiosa mais austera, encontrou-se com Santa Teresa que propôs uma Reforma na Ordem Carmelita para buscar o ideal de seus inícios: silêncio e solidão na União com Deus. Junto com outros companheiros iniciou essa nova experiência, porém, isso criou um grande descontentamento na Ordem e provocou uma dura perseguição a esses religiosos que buscavam a Reforma, principalmente São João da Cruz.
            No auge dessa perseguição, São João da Cruz foi preso em Toledo por seus confrades em 1577. Nesse sofrimento surge os seus mais belos poemas e pensamentos sobre a união com Deus.
            Para São João da Cruz, a União com Deus provoca na alma a chamada noite escura, fruto não de trevas exteriores, mas do próprio processo da união da alma com Deus:
Em uma noite escura,
De amor em vivas ânsias inflamada
Oh! ditosa ventura!
Saí sem ser notada,
Já minha casa estando sossegada.
(Canções da Alma. Noite Escura).
            Essa noite escura, é causada pelo próprio processo da União com Deus, pois o que a causa é o fogo amoroso de Deus, que vai consumindo a alma e fazendo unir-se ao próprio Deus (Cf. 2 Noite Escura 12,1).
            O fundamento da Mística de São João da Cruz é a União da alma com Deus, e o santo utiliza de toda um aparato literário e simbólico para demonstrar essa união.
            A experiência mística seria então a União, porém “Deus não se comunica à alma mediante qualquer espécie de visão imaginária, semelhança ou figuração e nem é preciso que assim o faça, mas boca a boca, isto é, a essência pura e nua de Deus que é a boca do Deus que ama, com a essência pura e nua da alma que é aboca da alma que ama a Deus” (2 Subida do Monte Carmelo 16, 9).
            Deus chama não os “santos” para entrar em comunhão com Ele, mas o homem pecador que O deseja ardentemente, “pois a conversão do pecador dá a Deus a ocasião de expandir uma medida mais abundante da graça” (Chama Viva de Amor 3, 42). Como disse Jesus: “Os sãos não precisam de médico, e sim os doentes; não vim chamar justos, e sim pecadores” (Mc 2, 17).
            Essa União transformante (Cf. Cântico Espiritual 22,3) acontece pelo amor e no amor, como explica o próprio São João da Cruz. “É o próprio Deus quem se comunica à alma, com admirável glória, transformando-a nele; ambos não fazem mais que um, por assim dizer como a vidraça com o raio de sol que ilumina, ou como o carvão inflamado e o fogo, ou ainda como a luz das estrelas com a do sol” (Cântico Espiritual 26, 4).
Na medida que esse intercâmbio entre Deus e a alma acontece, há uma transformação profunda da alma através e no amor de Deus. Pois a medida em que Deus se dá à alma, com livre e graciosa vontade, a alma também une sua vontade à vontade de Deus de forma mais livre e generosa. Entrega-se como dom ao mesmo Deus e em Deus. Essa entrega, essa dádiva da alma, é total e verdadeira. A alma começa a experimentar que Deus é verdadeiramente todo seu, e que ela possui esse mesmo Deus como sua única e verdadeira herança, e sente-se como filha adotiva de Deus, não por mérito seu, mas por graça concedida por esse mesmo Deus, que se dá à alma (Chama Viva 3,78).
Sem entrar nas dimensões cristológica  e trinitária desse processo de União, mas queremos mencionar que o Espírito Santo é esta chama que vai queimando no amor as almas (Cf. Chama Viva 1,19) e nessa transformação “é a caridade causa e meio para comunicação dos dons divinos” (2 Subida do Monte Carmelo 29, 6). E assim “A transformação da alma em Deus por amor logo se opera” (1 Subida do Monte Carmelo 2,4). Uma vez transformada essa alma se torna verdadeiramente “sal da terra e luz do mundo” (Cf. Mt 5,13-14).
Peçamos ao Senhor, pela intercessão de São João da Cruz, que façamos essa experiência do Amor de Deus, que seja uma experiência de União e ao nos unirmos ao Senhor, sejamos transformados por seu amor, e nos tornemos transformantes da humanidade, hoje, tão distante de Deus.

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